Cinema: O Contador



Direção: Gavin O'Connor
Elenco: Ben Affleck, Anna Kendrick, JK Simmons, Jon Bernthal
Gêneros: Ação, Suspense

Desde criança, Christian Wolff (Ben Affleck) sofre com ruídos altos e problemas de sensibilidade, devido ao autismo. Apesar da oferta de ir para uma clínica voltada para crianças especiais, seu pai insiste que ele permaneça morando em casa, de forma a se habituar com o mundo que o rodeia. Ao crescer, Christian se torna um contador extremamente dedicado, graças à facilidade que tem com números, mas antissocial. A partir de um escritório de contabilidade, instalado em uma pequena cidade, ele passa a trabalhar para algumas das mais perigosas organizações criminosas do mundo. Ao ser contratado para vistoriar os livros contábeis da Living Robotics, criada e gerenciada por Lamar Blackburn (John Lithgow), Wolff logo descobre uma fraude de dezenas de milhões de dólares, o que coloca em risco sua vida e da colega de trabalho Dana Cummings (Anna Kendrick).



Ainda temos dois meses pela frente, mas apesar de ter gostado muito dos filmes que se passaram e ainda querer ver outros, preciso já dizer que O Contador foi o melhor filme que assisti em 2016. Sem ressalvas. Tenho algumas críticas a alguns aspectos totalmente voltados à forma da narrativa, mas em aspectos de produção, atuação, estilo e trama esse filme detonou.


Sobre as críticas, digo agora: o personagem se autoclassifica como autista de alto funcionamento e como alguém que já estudou o assunto digo que pouquíssimas coisas mostradas no filme explicam porquê ele conseguiu se sair tão bem com suas limitações. Ele olha nos olhos das pessoas, mantém conversas inteiras e longas, demonstra preocupação e outros sentimentos de forma bem proeminente para uma pessoa que não recebeu acompanhamento terapêutico profissional (ou isso não foi mostrado). Há só algumas cenas em que percebemos que o pai dele o disciplinava. Só. Parece que o autismo foi usado como um motivo para seu excelente foco para tarefas. Mas digamos que o pai dele tenha tido uma ótima orientação e conseguiu (apesar das constantes mudanças de casa e ambientes - o que por si só já deixaria um autista bastante chateado).



Somos apresentados aos pais do Christian Wolff (nosso protagonista), num dos flashbacks dele, mostrando o dia em que o levaram para falar com um especialista sobre suas peculiaridades. Seu pai decide que não quer deixá-lo na casa de terapia, uma vez que o mundo não é um lugar amistoso de pura aprendizado e que ele precisa viver no meio do barulho e outros estímulos desagradáveis. Seu pai é militar, o que explica as habilidades que Christian vem a desenvolver mais tarde. Em diversos flashbacks podemos ver o modo com o qual seu pai criou a Christian e seu irmão mais novo, descrito como seu único e melhor amigo. Na sequência começamos a entender quem Christian se tornou através de uma cena surpreendemente fofa para um thriller e de um agente do tesouro nacional americano que - por acaso - percebeu um mesmo homem acompanhando vários chefões da máfia. Ele chama uma das analistas e a coage para ajudá-lo a investigar o caso. Enquanto isso, Wolff é contratado pelo dono da empresa Living Robotics, pois Dana, uma das contadoras, acha ter descoberto que tem dinheiro faltando nas contas. Nisso, começa nossa trama de suspense e violência. 


Wolff é uma cara focado e apesar das limitações que sua condição o impõe ele demonstra ter ido muito bem em entender e se virar em um mundo desorganizado com a ajuda de uma misteriosa mulher com voz robótica. Ele encontra o que há de errado nas contas da empresa e, obviamente, alguém não gosta nada disso e manda um grupo de assassinos de aluguel (muito bem apresentados em outras cenas) para matar a ele e à Dana. 



Todas as cenas de ação e pancadaria são empolgantes e bem colocadas. Não há visões desnecessárias a não ser para exemplificar a precisão com a qual Wolff faz as coisas. A trama foi tão bem pensada que não desconfiei do melhor segredo da trama. Temos alguns outros desdobramentos que me pareceram mais óbvios, mas cada coisa puxava pelo menos umas três possibilidades a explorar, o que culminou em uma narrativa surpreendente no todo. 

Devo dizer que o ''TOC'' que deram ao protagonista combina muito bem com as coisas que ele precisa fazer para se salvar e não ser reconhecido e também a pista necessária para alguém atento o encontrar. 

Não tenho o que dizer sobre fotografia já que o máximo que analisei foi que é sombrio o suficiente para manter o tom do filme. O gênero divulgado para mim poderia ter sido acompanhado do sub-gênero ficção científica dado algumas das descobertas finais. Foi uma ideia maravilhosa se pensarmos em estudos na área do autismo, mas ainda assim, muito ambiciosa.



As atuações... a Anna Kendrick é sem dúvida o alívio cômico (e necessário) ao filme. Sem grandes cenas, mas sem cenas ruins também. Ben Affleck pecou no sentido de atuar como alguém com espectro do autismo. Faltou dar uma credibilidade, estudar compensações das estereotipias. Se não havia no roteiro, ele mesmo poderia ter adicionado. Todo o resto do elenco é ótimo. Não é um filme com cenas que levem alguém ao Oscar ou Globo de Ouro (por trama, sim, por atuações não), mas mantém a realidade dentro da história. 

Felizmente ou infelizmente o final resgata algumas coisas perdidas da narração inicial e acaba trazendo um final fácil (difícil de perceber, mas fácil de fazer) e um desenlace um tanto quanto simples para a jornada do protagonista. 

O Contador vale a pena assistir por todos os aspectos citados acima: sua introspecção em um personagem nada comum, o uso dos elementos de investigação, a violência quase artística de Wolff e cada segredo que vai sendo revelado. Em um mundo Hollywoodiano cheio de remakes, sequências e filmes de quasrinhos sem profundidade ou até mesmo trama, esse thriller original torna-se único. 



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