Resenha: Surpreendente!



Título:
Surpreendente!
Autor: Maurício Gomyde
Editora: Intrínseca
Páginas: 272
Onde comprar: Saraiva
Sinopse: Aos 25 anos, recém-formado, Pedro está convencido de que é um sujeito muito especial, que tem a missão de usar o cinema como instrumento para melhorar o mundo. Diagnosticado na adolescência com uma doença degenerativa que o condenaria à cegueira, ele contraria a lógica da medicina quando a perda de sua visão estaciona de forma inexplicável. Enquanto comanda o último cineclube de São Paulo e trabalha em uma videolocadora da periferia, Pedro planeja seu próximo filme, a obra que vai consagrá-lo. E, para animar as coisas, conhece a intrigante Cristal, uma ruivinha decidida, garçonete e estudante de física nuclear, que mexe com seu coração. A perspectiva idealista de Pedro, porém, sofre sérios abalos. Atormentado por um segredo, ele parte com os amigos Fit, Mayla e Cristal numa longa viagem até Pirenópolis, em Goiás, a bordo de um Opala envenenado. Com câmeras nas mãos e espírito de aventura, a equipe técnica improvisada está disposta a usar toda a sua criatividade na filmagem feita na estrada ao sabor de encontros inesperados e de sentimentos imprevisíveis. E o jovem cineasta descobre que, quando o destino foge do script, nada supera o apoio de grandes amigos.

Sempre que tenho a oportunidade de ler um autor nacional, fico muito contente. A nossa literatura é fantástica, mas ainda são poucos que a valorizam. Então, quando "Surpreendente!", livro de Maurício Gomyde, surgiu como escolha em um clube do livro, fiquei empolgada para lê-lo. Não direi que atingiu todas as expectativas criadas, mas foi uma leitura bastante agradável.

"Surpreendente!" conta a história de Pedro, um cineasta de 25 anos que, aos 12, foi diagnosticado com um problema oftalmológico. A previsão era de que até os 20 anos ele perderia completamente a visão. Todavia, por um milagre da natureza, aos 16 anos seu problema estagnou, deixando-o com 70% da visão. Assim, motivado por suas dificuldades e pela graça que lhe foi concedida, Pedro sempre tenta mostrar o lado do bom da vida através da arte cinematográfica, mesmo que ninguém mais valorize seu trabalho. O problema é que a vida é uma incerteza, e tudo pode mudar de uma hora para a outra.

O cineclube que Pedro comandava foi fechado. A videolocadora em que trabalhava foi assaltada. Seus pais se separaram. As perspectivas médicas não eram as melhores. Sua avó esconde um grande segredo. Quando tudo começa a desmoronar em sua vida, Pedro se vê confrontado pela realidade que sempre tentou deixa mais colorida. Assim, decide fazer uma viagem com seus amigos Fit, Cristal e Mayla para a cidade de sua avó, Pirenópolis, onde poderá gravar seu último e mais diferente filme, uma filme sobre as chances da vida, mesmo que elas nem existam.

O livro é narrado em terceira pessoa. Ainda assim, foca somente na visão de Pedro acerca dos acontecimentos. Pedro não é protagonista mais cativante que já foi descrito e, por vezes, suas maneiras chegam a incomodar, como suas eternas frases de efeito e comparações a filmes clássicos. Porém, ao longo da história, a empatia pelo personagem vai aumentando. Se antes era um rapaz que via tudo colorido, depois passou a ver os tona obscuros da vida. Seu crescimento dentro da história, portante, foi algo interessante.

"Se vou me lembrar de ontem na noite do ano novo? Provavelmente"[...]
"Este se 'provavelmente' deve ser encarado como algo animador? Não sei se você respondeu com um sorriso ou com a cara amarrada..." [...]
"Eu estava sorrindo, sim" [...]
"Quem sabe a gente se encontra algumas vezes antes dessa noite de fim de ano e consigo convencê-la a trocar esse 'provavelmente' por um 'certamente'?"
"Uma coisa não posso negar: você tem autoconfiança."
"Isso é uma coisa boa, não?"
"Provavelmente..."
"Tudo para você começa no 'provavelmente' e termina onde?"
"Nas certezas da vida."
"Certezas?"
"Sou física nuclear. Os físicos nucleares só acreditam no que realmente podem provar."
"Se me der oportunidade, sou capaz de provar que vai alterar aquele 'provavelmente' para 'certamente'."
"E como vai fazer isso, senhor autoconfiante?"
"Sou cineasta. O trabalho de um cineasta é fazer as pessoas acreditarem naquilo quase impossível de ser provado."
"E sair do cinema com a ilusão de que a vida é perfeita."
"É o que chamo de Cinema Felicidade."
"Aceito o desafio, mas não se esqueça: físicos nucleares só contentam com provas irrefutáveis..."


Achei o início do livro um tanto maçante. A descrição e apresentação dos personagens demorou muito em minha opinião, além de não ter sido algo aprofundado - gosto quando mais facetas dos personagens são reveladas. Ainda, achei que os romances se desenvolveram muito rápido e não me convenceram. Porém, entendo que a intenção da história fosse outra. Apesar destes detalhes terem atrasado minha leitura, a partir do momento em que tudo começa a ruir na vida de Pedro, a história agita-se e a leitura flui de maneira perfeita. Enxergamos, finalmente, o quanto os problemas de Pedro afetam sua personalidade e suas atitudes. Vemos, enfim, como sua visão de mundo limitada fornece a ele uma amplitude na visão acerca da sociedade e dos relacionamentos.

Gostei bastante da segunda metade da história e não acho que o final tenha deixado a desejar. Acredito que o modo como o autor conduziu o encerramento foi o melhor possível e bastante emocionante. Apenas um detalhe do final acredito que pudesse ser deixado de lado, uma vez que não foi desenvolvido. Entendo que a intenção era deixar algo em aberto, mas não acho que tenha atingido adequadamente o objetivo.

Por fim, recomendo bastante a leitura. A escrita de Maurício Gomyde é muito boa e nos faz refletir bastante. Embora o início do livro possa ser de mais lenta ultrapassagem, a parte final é excelente e flui rápido. Recomendo não somente por ser um livro nacional, mas por ser uma leitura agradável. Além disso, Gomyde mostrou que uma grande história também pode ser escrita dentro do Brasil - falo isto por existir uma cultura de que os enredos passados em território nacional possuem menor qualidade que os descritos em território estrangeiro -, com personagens brasileiros, com descrições da cultura brasileira e do cotidiano brasileiro, sem que esta história seja caricata ou extremamente regionalista. Leiam, pois vale a pena!


- A vida real é como o jogo da velha, Cristal. Quando os jogadores aprendem seus segredos, o resultado sempre dá velha.
Cristal manteve silêncio por algum tempo, parecendo absorver a tese. Em seguida, refutou:
- Mas sempre haverá a chance de vocês conseguir uma jogada realmente surpreendente, aquela que ninguém jamais tentou. [...]


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